Instalação "Prête moi ta plume pour écrir'amour" no Ateneu do Catorze | Artistas IN VITRO-Exposições temporárias em espaço fecundo

 

Foto de Francisco Salgado de Kessler

Notas para quem passa

Todos estes lençóis, fronhas, manta, xaile, candeeiro, pertencem à minha casa de família, ao meu quarto, à minha infância e adolescência.

Os cortinados estavam na sala e sempre me escondi atrás deles e passeei imaginariamente entre as flores, absorvendo as suas cores luminosas e vibrantes que abriam com o sol.

Os lençóis e as cortinas foram confeccionados com carinho pela minha mãe, e as peças de lã, com o mesmo carinho, pela minha avó Rosário. Tal como as camas, onde eu e o meu irmão dormíamos com os lençóis amarelos, foram feitas com carinho pelo meu pai.

Estas peças e experiências fazem parte do meu ADN, ajudaram-me a crescer, e a crescer com uma visão orientadora e específica da vida: cor, alegria, criatividade, beleza, energia, calor, afecto, protecção.

Não foi por acaso que não tive um quarto cor-de-rosa.

Todas as escolhas dos elementos de construção e decoração da nossa casa foram feitas pelos meus pais em conjunto e, provavelmente sem pensarem nisso, mostravam-nos os seus valores e aquilo que queriam para nós.

A minha mãe cantava-me esta canção* para me acalmar e ajudar a adormecer.

Adormecer sozinha em adulta quer dizer activar essa memória e poder em relação a mim própria, por isso hoje a canto também, alternadamente com ela, como uma dança da chuva para dormir (porque neste momento gostava mesmo de dormir como uma criança).

Empresta-me a tua caneta para escrever uma palavra, ouve-se na letra original cantada pela minha mãe.

Empresta-me a tua caneta para escrever Amor, ouve-se na letra que canto, porque foi isso que sempre ouvi/senti.

Mais tarde observei muitas vezes com admiração a forma aprimorada e carinhosa com que o meu pai engomava e dobrava os lençóis. Pedi-lhe para engomar mais uma vez estes lençóis e ele carinhosamente acedeu.

Os da cama de criança engomei eu, primorosamente e com o mesmo carinho.

Este é um espólio que quero reactivar, expor e proteger.

Como disse ao Francisco esta é realmente a minha paisagem protegida.

Embora não tenha sido perfeita nem tenha durado para sempre, durará para sempre em mim e nas peças que for construindo com estas memórias.

Rita Carmo

*Au Clair de La Lune

Foto de Francisco Salgado de Kessler

Foto de Francisco Salgado de Kessler




Até meados de Dezembro:

Ateneu do Catorze
Rua do Comércio, 12, 14 e 16
7630-462, São Luís
Odemira
Portugal


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